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Trusts estrangeiros X tributação da transmissão da propriedade no brasil. Entenda!

Trusts estrangeiros X tributação da transmissão da propriedade no brasil. Entenda!

22/03/2023 às 16h29 Atualizada em 22/03/2023 às 19h29
Por: Redação
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Imagem por @caciomurilo1 / freepik
Imagem por @caciomurilo1 / freepik

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº 145/2022, que dispõe sobre a lei aplicável ao trust, sua eficácia e seu tratamento tributário no País (https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2339412).

De acordo com a definição encampada pelo Projeto, o trust é um instituto jurídico de direito estrangeiro resultante da transferência de bens ou direitos com valor econômico feita por uma pessoa física ou jurídica, designada instituidor (settlor), a um proprietário formal, designado trustee.

Embora o trustee seja o proprietário formal dos bens e direitos, ele não tem liberdade para fazer o que bem entender com eles. Concomitantemente ao nascimento do trust, nasce também o direito de propriedade ou titularidade autônomo dos beneficiários dos bens ou direitos transferidos, beneficiários estes que devem ser designados no ato de constituição, conforme a vontade do instituidor. Lembrando que o instituidor pode figurar também como beneficiário do trust.

Assim, o trustee é a pessoa que recebe a guarda e a propriedade formal de bens ou direitos com valor econômico integrantes do trust e assume deveres perante os beneficiários e em relação ao patrimônio integrante do acervo. Tem-se, então, o desmembramento da propriedade em (i) propriedade formal – exercida pelo trustee, e (ii) propriedade autônoma – exercida pelos beneficiários.

O projeto de lei complementar, conforme expresso em sua exposição de motivos, não se propõe a instituir o trust no Brasil, visto que esta iniciativa já se encontra em tramitação no Congresso Nacional por meio do Projeto de Lei nº 4.758/2020, de autoria do Deputado Enrico Misasi, que dispõe sobre a fidúcia (trust) e dá outras providências (https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2263549). Já p PLC nº 145/2022 concentra-se, tão somente, em reconhecer e disciplinar os efeitos produzidos, no Brasil, por trusts formados no exterior. Aceita, portanto, as regras estrangeiras a eles aplicáveis, conforme disciplina do Direito Internacional Privado, sem almejar reconstruir localmente regime jurídico que já se desenvolveu com grande segurança nos países anglo-saxônicos (especialmente Reino Unido), desde a Idade Média.

A exposição de motivos do projeto ressalta, outrossim, a utilidade do instrumento: o trust serve a diversos propósitos relacionados à organização, preservação e destinação de patrimônio. Seu uso é especialmente difundido, por exemplo, entre pessoas com herdeiros portadores de deficiências graves, pois permite que, respeitadas as regras sobre sucessão necessária, seja o restante do patrimônio vinculado a necessidades essenciais de incapaz, sob a administração de pessoa de confiança do criador do instrumento (e.g. instituição financeira especializada na administração de patrimônios, que neste caso seria o trustee).

Pois bem, em que situações a legislação brasileira alcançaria um trust estrangeiro por meio da tributação sobre a transmissão da propriedade?

Para responder a essa pergunta, é necessário clarificar que, na criação e operacionalização do trust, há (i) transferência de propriedade, do instituidor (settlor) para o trustee, e (ii) transferência de renda e propriedade (do trust para os seus beneficiários, operadas pelo trustee).

Assim, os potenciais impostos são o imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza (IR – de competência federal), imposto sobre a transmissão causa mortis e doações (ITCMD – de competência estadual) e imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI – de competência municipal).

Como o Brasil não detém jurisdição sobre territórios estrangeiros, os impostos sobre a transmissão da propriedade somente podem alcançar bens e direitos situados no território brasileiro.

O projeto sob análise determina que haverá a incidência do ITCMD quando um beneficiário adquire o direito de receber qualquer parcela de patrimônio ou renda decorrente dos ativos integrantes do trust (esta aquisição decorre do nascimento do direito de propriedade ou titularidade autônomo dos beneficiários dos bens ou direitos transferidos).

Esse beneficiário é chamado de “efetivo”, como, por exemplo, aquele que recebe aquele direito, por doação do instituidor, sem a estipulação de qualquer condição. Há também o denominado “beneficiário potencial”, definido como sendo aquele que ainda não adquiriu esse direito. Um exemplo de “beneficiário potencial” é a pessoa que somente adquirirá o direito de receber qualquer parcela de patrimônio ou renda decorrente dos ativos integrantes do trust com o falecimento do instituidor.

Logo, enquanto não houver um “beneficiário efetivo” nos termos da lei, não haverá incidência do ITCMD.

Por sua vez, na transferência bens e direitos do instituidor para o trustee, para a formação do patrimônio do trust, não haverá a incidência do ITCMD. O Projeto também prevê a não incidência de ITBI nesse caso.

A propósito, quanto ao ITBI, há duas hipóteses de incidência. A primeira se configura com a entrega de bens imóveis ou direitos reais sobre imóveis ao beneficiário efetivo quando tais bens foram adquiridos com resultados auferidos pelo trust após a configuração daquela condição – a de beneficiário efetivo. A segunda situação é a entrega ao instituidor, na qualidade de beneficiário, de bens imóveis ou direitos reais sobre imóveis que não tiverem sido previamente transferidos por ele, instituidor, ao trustee.

Como estamos tratando de trusts estrangeiros, nem sempre será fácil demonstrar essas circunstâncias aos fiscos municipais brasileiros.

Há uma circunstância jurídica que não está claramente delineada pelo projeto de lei. Trata-se do chamado revocable trust, ou seja, trust revogável.

O instituidor, ao estabelecer as regras do trust e os bens que farão parte do seu acervo, pode resguardar o direito de revogá-lo a qualquer tempo. Ausente tal previsão, a maioria das jurisdições internacionais considera que o trust é irrevogável.

No caso do trust revogável, seria constitucional a incidência do ITCMD tal como expresso acima? Relembrando: haverá a incidência do ITCMD quando um beneficiário adquire o direito de receber qualquer parcela de patrimônio ou renda decorrente dos ativos integrantes do trust.

Havendo a revogação do trust, a propriedade retornará ao patrimônio do instituidor, frustrando a expectativa do seu recebimento pelo beneficiário.

Entendo que no trust revogável não há manifestação peremptória de capacidade contributiva do beneficiário até a data da morte do instituidor, quando então não haverá mais possibilidade de se o revogar. Diferentemente do trust irrevogável, em que, no mais das vezes, a propriedade será efetivamente transferida ao beneficiário em algum momento no futuro. No trust irrevogável, o bem já constitui propriedade autônoma do beneficiário desde o seu nascimento e não está sujeito, em regra, a nenhuma condição para futura transferência da propriedade formal pelo trustee.

Situação mais complicada seria o trust em que o instituidor reserva o direito de emendá-lo ou alterá-lo. Entende-se que um poder ilimitado de emenda abrangeria o poder de revogação. Mas isso, naturalmente, vai depender da interpretação do instrumento que criou formalmente o trust.

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Diante da iminência da aprovação do trust no Brasil, haverá em breve um campo vasto para a criação legislativa, visto que, como dito no início, este projeto de lei aqui sob comento não abrange os trusts que vierem a ser criados pela lei brasileira. Esse é um tema cativante e certamente trará para o debate questões de grande relevo para a sociedade brasileira. A importância do instrumento, acima ressaltada, ajudará muitas famílias com pessoas portadoras de deficiência cognitiva, bem como trará uma nova seara de planejamento sucessório, além de propiciar a criação de trusts dedicados à caridade.

Por Dalton Dallazem, Advogado Especialista em Tributação Internacional.

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